quarta-feira, 18 de maio de 2011

dissertação

Estava meio assim pra postar a dissertação, não tinha achado nenhuma ferramenta decente de pdf no blogger... mas o pessoal lá do CMI-Brasil (que como é parte do meu objeto de estudo, me senti na obrigação de enviar pra eles) postou na publicação aberta o resumo e um link com a dissertação em pdf (gentil da parte deles). Assim passo o link pro post:

terça-feira, 3 de maio de 2011

A morte de Bin Laden e as lutas em rede

A mídia vampiriza o acontecimento; dá uma super exposição, dá a impressão de que ele é muito mais importante do que é; assim tem alguns dias de tema para seus receptores. Ela sabe vender o acontecimento. Foi assim com o tal do “casamento real”. Quanto à morte do Bin Laden, é o mesmo, vamos ver por quantos dias a mídia vai conseguir manter as pessoas interessadas.

Mas essa vampirização deixo de lado. Fico no que é dito: mataram o inimigo da América. A América una venceu este outro corpo também uno, o líder do terrorismo. Como sempre um contra um. A matemática mais simples; até as crianças entendem. É claro que a dicotomia seria mais visível se tivesse acontecido na era Bush. Duas figuras carismáticas. Dois odiosos. Um em nome do bem, o outro a encarnação do mal.

Pelo que nos é dito, ou melhor, imposto, a AL Qaeda é centralizada. Tinha um líder. Assim reproduzia uma estrutura antiquada. Negava o poder da rede.

O mais interessante é que todo esse joguinho que vende, obscurece o outro jogo. O Império está sob enfrentamento de rede de redes que não é composta de terroristas, isso há mais de uma década. E poucos entendem. A mídia até agora não entendeu as resistências, como poucos entenderam que o poder é também uma rede de Estados, corporações, ONGs, mídias, instituições supra-nacionais. E como dizem Negri e Hardt: contra uma rede apenas outra rede. É, é o pensamento que é lento, não a vida. Mais lenta que a mídia apenas a opinião do idiota, que, aliás, faz parte do seu discurso.

Essa rede – de insurgência – também sofreu com os atentados do 11 do 9. O estado de exceção criado após a queda das torres gêmeas aconteceu na mesma época dos dias de ação global, as primeiras lutas contra o Império, os movimentos de multidão, por outra globalização, os primeiros em rede com alcance e demandas globais. E claro, estes são menos potentes violentamente que o terrorismo. Mas são potentes, pois buscam a felicidade, a alegria contra o mundo de tristezas (fazendo distinção entre a tristeza e a alegria, terroristas e a América e os países dominantes se assemelham). São potentes, pois buscam uma democracia sem liderança, sem o corte entre dominantes e dominados, democracia de todos para todos; verdadeira democracia contra esse governo de poucos sobre muitos.

Os movimentos de multidão, sim, são efetivamente uma ameaça ao Império. Como foi dito acima: contra uma rede apenas outra rede. Mas fecham os olhos para eles e veem apenas o previsível.

As associações usadas como potência pelos alterglobalização, além de serem democráticas internamente, são impossíveis de deter. E mais, anunciam um novo mundo, pois não querem tomar o lugar da governança transcendente, mas usar sua própria forma e conteúdo como modelo para outra realidade.

Bin Laden tinha que morrer. Sua guerrilha dizia respeito a outro paradigma, antiquado. Se tivesse aprendido com os movimentos por outra globalização, com a EZLN, ou mesmo com a estrutura organizacional da internet, se tivesse dado atenção para as mudanças nas formas de produção, na estrutura do poder, todos em rede, sua morte não seria significativa. E talvez não seja, isso é a mídia quem diz. O tempo dirá, se a Al Qaeda era realmente centralizada em uma figura carismática, reflexo da modernidade, que felizmente já era.

domingo, 1 de maio de 2011

O biopoder midiático e seu impedimento do devir

(Estou produzindo essas pequenas criticas partindo do discurso das mídias tradicionais, corporativas. Como não há fora delas, isso é fácil. O desafio é criticar tendo como base as teorias de Negri e Hardt, Cocco, Deleuze e Guattari, Antoun, e um pouco do que foi apropriado de Foucault por esses.)

A mídia trata os sujeitos como pertencentes a segmentos endurecidos. Um passinho à frente é a inclusão nos segmentos do que se considerava como minorias até um certo tempo; no entanto os negros, homossexuais, mulheres são recuperados deixando de ser sujeitos à margem e são enquadrados a partir de identidades, o que elimina a possibilidade de singularidade.

Isso impõe um tom de espanto, pois os que lutaram nos anos 60, apenas começaram a ser reconhecidos há pouco tempo em um momento de tomada generalizada do capital, que necessita da inclusão de consumidores e produtores.

Mas fiquemos na questão de produção de identidade e no impedimento de linhas de fuga.

O corte que mais merece atenção concerne às características de homens e mulheres, estes opostos, como pertencentes a substâncias de natureza diferentes e simétricas. No discurso da mídia: “homens são assim”, “mulheres fazem isso”, “blá, blá, blá”. Quanto a esse dualismo, Deleuze e Guattari lutaram, principalmente em Mil Platôs. Não há diferença de natureza entre o homem e a mulher (explico isso melhor mais adiante). A mídia e a academia (o lixo da academia, o discurso dominante, o mais careta, que é aliado das mídias tradicionais) dizem que sim, e, assim, estes devem ser identificados de forma diferente.

O conceito de devir é resposta à produção de identidade. Entre homens há diferenças de natureza, como entre mulheres, entre brancos, entre negros, entre homossexuais. Ou seja, no interior dos estratos. Estes experimentam micro raças, sexos, condições mentais, que transcendem as classificações-clichê. A pergunta de Espinosa “o que pode um corpo”, faz aproximação entre termos heterogêneos, como impede o enquadramento. Quais devires são experimentados por tais subjetividades em um agenciamento dado? Um bom problema para o começo de uma cartografia.

Nega-se a mulher, o negro, a lésbica, o gay, etc. no corpo do homem, branco, heterossexual. Não se reconhece os devires da mulher, dos negros, dos homossexuais. Ainda mais que pela inclusão da indústria cultural, essas supostas minorias não são mais que estereótipos. Por isso a pergunta: nesse quadro, o que implicaria um devir negro, mulher, gay, etc?

Deleuze e Guattari diziam que não há devires do homem, pois ele é majoritário por excelência; se as antigas minorias se legitimam, o que ainda possibilita o devir-minoritário? Os ratos, os ciganos, os pombos, os migrantes, os favelados, os Okupas, a zona B de Szaniecki, o sul de Cocco, o drogado não psiquiatrizado, o marginal?

O devir é negado e assim impedido, por ser nossa potência e alegria. Impede-se a alegria para produzir um mundo de tristezas. O biopoder impõe a tristeza, sua função. O poder sobre o corpo do discurso midiático é um de seus elementos, saber-poder que não pode ser desvinculado da produção de subjetividades sujeitadas.

Esboço de crítica da crítica

(escrevi esse texto pra uma disciplina. A idéia era produzir uma crítica das mídias. o exercício foi interessante, pois foi sugerido um texto menos endurecido que o texto acadêmico. Acho que ele se manteve duro, mas não tanto, pelo tamanho. O texto é antigo e foi publicado no blog do GPJOR. Posto aqui, pois acho que tem relação com a proposta atual do blog. Mas o texto é de uma época bem verde, ainda não estava amadurecida a recuperação do eixo teórico que trabalhei no mestrado.)

A “satanização” das comunicações diz respeito, em parte, a antiquada esquerda, que não consegue enxergar os possíveis da realidade não apenas comunicacional atual. Isso foi dito, com outras palavras, por Antonio Negri (1993), e entendemos que ele se referia à tradição apocalíptica, que, segundo José Luiz Braga (2002), por incrível que pareça, persiste nos dias de hoje, como seu oposto, os integrados. Para nós, essa corrente de pensamento (apocalíptica) atualmente, ou melhor, a partir da virada do século, se apóia na crítica negativa das novas tecnologias de comunicação e informação. Consideramos também que ela não se limita ao campo das mídias, pois as mudanças tecnológicas ocorrem conjuntamente a mudanças políticas, culturais e econômicas, próprias da globalização, ou, melhor, da ordem mundial que Negri e seu companheiro Michael Hardt nomearam, mais especificamente, de Império, no livro de mesmo nome (2006). Na obra, o conceito de Império se choca ao de multidão – potência positiva da realidade atual.

Mais ou menos na mesma época em que Império foi lançado, três textos apocalípticos surgiram, chorando o passado perdido, o declínio do Estado-nação, o fim das grandes narrativas, mesmo que o conteúdo principal seja a fobia frente às novas tecnologias de comunicação, principalmente a internet.


Esses textos de Joel de Rosnay (2002) e Ignácio Ramonet (2001; 2002) resumem muito bem um certo espírito derrotista, em que o passado se mantém como um fantasma. Para ambos, a internet é uma rede sem centro caótica, e as outras mídias são engolidas por ela. Neles, as mídias de massa tradicionais, estão em crise, e uma horda de bárbaros digitais se apropria do seu o espaço, e não há mais nada a fazer. Ramonet (2001) especifica essa discussão, tendo o jornalismo como objeto. Para o autor, esse tradicional instrumento das sociedades democráticas estaria sendo corrompido a tal ponto que sua morte é inevitável.

A proposta inicial deste ensaio era uma crítica das práticas jornalísticas, mas decidimos trabalhar com um tema mais amplo, as mídias como um todo, pois as questões expostas aqui não são restritas. Mas quando falamos em mídias, consideramos também, é claro, o jornalismo.


No ano em que Império (o livro) foi lançado, e também nos anos posteriores, o poder hegemônico foi abalado pelos governados e explorados, por uma insurgência global, que foi traduzida em Multidão: livro de Negri e Hardt (2004) que agora dá espaço maior as potências reais de transformação da ordem mundial. O livro vem de carona com as manifestações de Seattle, contra a guerra do Iraque, os Fóruns Sociais, alguns exemplos dessa insurgência. Multidão, como já acontecia em Império, vai de encontro à posição passiva apocalíptica – essa crítica pela crítica que nada propõe – e de forma alguma se alia aos integrados, pois a democracia real (sonho da multidão) não está dada, deve ser criada.

Algumas semanas atrás, o assassinato de um sem-terra, em confronto com a polícia, recebeu destaque nas mídias. O fato nos impôs a lembrança de que há uma resistência no Brasil consistente, que á aliada de resistências globais, como a Via Campesina e a rede Zapatista. Todas reivindicam a terra, este bem que deveria ser comum, de todos, como é a linguagem, nosso corpo humano, nossa produtividade que constrói o mundo.


Se de um lado há esse poder hegemônico, em que não há mais um sujeito em oposição bem definido, como no marxismo, o qual Ramonet chora – talvez sem saber –a falta; de outro lado, há essa multidão singular que se quer assim, e que resiste. A multidão, aos poucos, mina os poderes, sua revolução não chegará, ela acontece, é um processo em andamento.

Deveríamos nos perguntar de que lado nós estamos: aceitaremos nos misturar a multidão e lutar por uma realidade menos endurecida, ou apenas ficaremos sentados, chorando a perda de um passado provavelmente mais triste que a realidade atual?


Quanto ao jornalismo, talvez sua morte nos permita dar um passo para esta outra realidade, essa sim democrática. O corte entre produtores e leitores, no jornalismo, há muito separa a multidão, impõe hierarquias, permite que apenas poucos representem muitos – reflexo da democracia representativa. Mas como cada vez mais esse corte é esmaecido, a questão agora não é mais “quem vai falar”, mas “o que falar”.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

o discurso moralista do jornal Zero Hora

Saiu uma matéria no jornal mais famoso do RS, Zero Hora, sobre uma rua da cidade de Porto Alegre, a Lima e Silva. No texto é dito que a rua estaria sendo invadida, principalmente aos domingos, por uma horda de jovens que a tornam um “antro” de sexo, drogas, e outras coisas: sexo em banheiros de estabelecimentos comerciais, uso de drogas nas calçadas, agressão aos moradores.

Primeiro não se sabe o quanto verdadeiro é o relato do jornal. Expõe apenas o ponto de vista daqueles que são afetados pelo sucesso da rua (se tornou, nos últimos anos, “o local” da noite da cidade): os moradores (os poucos que não usufruem da rua para diversão, pois pela proximidade com a UFRGS boa parte dos moradores é jovem) e os comerciantes que veem seus estabelecimentos serem invadidos por uma turma que consome pouco e faz muito barulho.

Os donos de bares não serviram como fonte na matéria, mas sim o representante do Guion, o dono de uma livraria, o gerente de supermercado. Estes mais os moradores são aqueles que lucravam com a Lima e Silva quando ela era mais tradicional, uma rua familiar.


A Zero Hora é um jornal família, para as famílias de classe média, estas gostam de uma vida calma, sem barulhos, o jornal assim as representa. Por isso o jornal é conservador, defende algo como “a moral e os bons costumes”. O mais interessante é que os jovens que se drogam e transam em banheiros são os filhos dessa classe média.

O jornal postou fotos com legendas do tipo: “sem limites”. A maior parte era de garotos e garotas se beijando. As fotos estavam desfocadas. Uma foto era de um guri deitado no chão, provavelmente bêbado. Nada de mais, o que choca no texto é o tom alarmista, careta.

E se rola lá sexo em qualquer lugar e se todo mundo se droga? Talvez seja verdade. Minha hipótese é que os jovens fazem isso como resistência exatamente a esse discurso e essa vida criados pelos meios conservadores, a classe média, papai e mamãe. Volta e meia alguém fala da “adultificação precoce das crianças”; mas a questão é exatamente o contrário, da infantilização prolongada.

Tentam punir e vigiar os jovens, impedindo o mínimo de autonomia. Eles não podem beber, não podem entrar em festas, não podem se divertir. Tentam tornar o mundo da juventude algo sufocante: eles deveriam estar em casa com papai e mamãe, como a criança está.

O emprego que oferecem para eles é precário, impossível ter autonomia financeira para sair de casa e fazer a vida. Autonomia intelectual também é difícil, considerando que impõem uma educação idiotizante, não lhes dão alternativas. A saída é se agarrar no que é mais fácil para criar um mundinho: ser punk, emo, metal, hip hop, ou fazer parte de guetos relacionados a sexualidade. Quanto à droga que atravessa todos esses segmentos, é a possibilidade de liberdade, pelo menos até o barato acabar ou até bater a ressaca.

Pelo discurso da Zero Hora parece que a Oswaldo Aranha foi transferida para a Lima e Silva. Creio que parte dela, a outra parte é tão nova que provavelmente nunca ouviu falar sobre o antigo ponto underground da cidade. Na monografia fiz uma etnografia da rua. Os fatos que narrei são muito, mas muito mais radicais que os narrados pelo jornal. A Oswaldo era um ponto em que a vida pequeno burguesa era implodida: sexo, drogas, violência corriam soltos.

E não importa se era bom ou ruim, e se hoje na Lima e Silva isso é bom ou ruim, mas o que motiva os jovens: a fuga das disciplinas, a busca de autonomia, construir um mundo, resistir, essa é a única forma que encontraram para lutar contra aqueles que lutam contra eles, seus pais e a Zero Hora, os seus verdadeiros inimigos.

As drogas e o sexo são os seus aliados. Estão sempre ali, prontos para os acolher. Eles não têm limites, dizem as legendas. Essa é a real, eles estão cheios dos limites, dessa vida de todo mundo que constroem para eles.

Passaram mais de uma década trancados em casa. Vivendo como refugiados. E ainda dizem que ser criança é ser feliz, mas não há nada mais triste que ser um refugiado, um prisioneiro político, o que as crianças são, como disse Godard.

Quando o corpo fica mais forte e a cabeça começa a funcionar, o jovem diz: quero minha vida, uma vida singular, e faz ela, uma vida não muito rica: um visual, uma relação com a sexualidade mais livre, sem complicações, novas percepções permitidas pela droga, uma semiótica gestual andrógina, um discurso não legitimado. Deleuze que repetia: fugir, mas na fuga procurar uma arma. Os jovens traçam sua linha de fuga, e essas são suas armas.

Mas por qual razão isso é tão diferente da semiótica, do regime de signos, dos adultos? O mundinho dos jovens marca o limite: nós não queremos ser como vocês. E a vidinha tradicional da família e o discurso da Zero Hora não aceitam isso. Eles dizem: sejam como nós, ou melhor, sejam quem nós queremos que vocês sejam. Sejam nossos prisioneiros. Não cresçam, fiquem em casa, pulem a adolescência. O cidadão perfeito, o bom filho, seria aquele que sai da infância direto para o casamento, para a vida dos pais.

Parece que estou falando de conflito entre gerações, mas a questão é geográfica, de território: um careta, o território legitimado, de papai e mamãe; o dos jovens parte de desterritorialização do território careta que é re-territorializada num mundinho mais próximo do devir: devir-drogado (demora muito tempo para se tornar um drogado como estado), devir-homossexual (eles experimentam a sexualidade que vai ganhar forma bem depois), devir-marginal (são marginais relativos).

Aí sim a juventude se torna um entre dois de um discurso não redundante, sem clichês, um entre dois estados duros que se complementam: a infância e a vida adulta. Esse entre dois é preenchido por devires especiais, mas também por microfascismos: o ódio entre grupos, punks contra emos, metals contra punks, skatistas contra surfistas, black metals contra todos, bandinhos territorializados em palavras de ordem e violência.


E as drogas e o sexo como símbolos de libertação podem virar linhas de fuga mortíferas, vício, overdose, prisão, AIDS, gravidez. Mas isso faz parte da experimentação. Com toda sua dor e alegria. Mundinho que parece ser pequeninho, com alguns momentos de brilho, mas mais que isso não é possível, e essa impossibilidade não é culpa deles.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

pela molarização das mídias moleculares

A partir da experiência no mestrado em comunicação na Unisinos cheguei a outra conclusão: o mais comum no campo são estudos críticos sobre a mídia dominante. Praticamente todos os textos que estudei para as disciplinas no mestrado eram desse tipo. Bem, não vou dizer que isso é negativo, quanto mais críticos melhor, ainda mais dessa máquina que legitima o poder. No entanto o problema é que isso pode levar a desconsideração da produção de mídias feita pela multidão.

A falta de estudos das mídias de multidão se dá por algumas razões: a mídia tradicional é a mais conhecida, faz parte de nossas vidas, não há fora das mídias dominantes, e elas são molares, legitimadas, bem formadas – atirar nelas é fácil, o alvo é muito bem visto. As mídias que a multidão produz são moleculares, sem forma definida, estão em devir, experimentam um devir-midiático, suas atualizações são monstruosas – capturá-las exige um método.


Falar nas mídias molares é expor seu poder, o biopoder, o poder sobre a vida, a captura do simbólico, a manutenção da ordem, falar nelas é falar na sociedade de controle, no Império; daí a importância dessa crítica, que é centrada em algo negativo.

Falar das mídias moleculares é falar na multidão, em sua biopolítica, na potência, na vida que constrói vida, ou seja, na positividade; no entanto é falar também nas mídias molares, pois as mídias de multidão surgem exatamente como resistências às mídias dominantes; como diz Peter Pelbart: contra o poder sobre a vida deve se insurgir o poder da vida. É, portanto um objeto de estudo mais completo, como também mais aberto a um campo de possíveis.

Mas devemos perguntar o que são mídias de resistência, da multidão. Há uma resistência mais direta que diz respeito a coletivos (que misturam política, mídias, arte, etc); às redes de resistência baseadas na internet, como o movimento Zapatista; aos hacker-ativistas que sabotam websites de governo ou de corporações e funcionam apenas no ciberespaço. Também os grupos de resistência do movimento por outra globalização fazem sua mídia, têm seus sites, e se re-apropriam de canais como facebook, twitter, blogs.

No entanto a web 2.0, a web colaborativa, já nasce na resistência. A web 2.0 é segundo momento da web e diz respeito à disseminação de produtos feitos por redes de colaboração de usuários da internet: os blogs, wikis, os softwares livres, o jornalismo participativo, as redes sociais, o youtube.

A expansão dessas mídias “das” massas (expressão usada por Malini) acontece pelo descrédito em relação às mídias hegemônicas. A multidão reconhecendo o lucro como finalidade dos meios “de” massa, sua parcialidade, o poder dos monopólios, produz sua própria mídia, alavancada pelo acesso a todos da internet, tornando a sugestão de Jello Biafra “não odeie a mídia, torne-se ela” realidade.

No entanto a web 2.0 é espaço de conflito entre a produção que extrapola as mídias dominantes e os discursos redundantes que emergem das mesmas.

Sobre a teorização das mídias que são puramente de resistência, no Brasil temos duas linhas igualmente importantes: 1. Trabalhos acadêmicos que são tentativas de produção de teoria minoritária no campo de estudos. 2. Teorias produzidas por coletivos ou indivíduos com afinidade direta com esse tipo de resistência - que criam território no qual teoria e ativismo não são identificáveis como unidades isoladas - e que não estão vinculados ao mundo acadêmico. Temos como exemplo deste último grupo, no Brasil, o trabalho de Ricardo Rosas, o extinto site Rizoma, algumas publicações da editora Conrad.

Percebemos assim um duplo devir, teórico e midiático, que está sendo atualizado. A função dos teóricos de mídia seria a de molarizar esses campos de possíveis, dar forma, definir seus contornos, sem estancar suas potencialidades.

sábado, 2 de abril de 2011

o caso Bolsonaro

A mídia conservadora está dando atenção para o caso do Bolsonaro; esse cara com, no mínimo, sérios problemas mentais. No entanto, parece que o mais importante tem ficado de lado; a mídia não está fazendo a defesa dos homossexuais, mas apenas dos negros. Parece que ainda é normal temer a homossexualidade: “nossa e se for com nossos filhos?”, “será que sou uma bicha enrustida?”.

Mas como os negros são recuperados os homossexuais também. Ivana Bentes diz que parte da mídia faz sua captura das minorias; o mais comum em programas de diversão, o tom conservador fica com o jornalismo.

Tenho recebido petições contra o Bolsonaro. Já vi manifestações on line. Só que acho que isso é uma luta contra um inimigo quase invisível. Caras como o Bolsonaro são minoria. A mídia está do lado desses que querem a cabeça do militar. Ela não aceita radicalismos. E por isso é perigosa.


A mídia com esse discurso pode marginalizar as resistências que buscam uma radicalização da democracia. Estando do lado dos moderados, conserva, legitima a ordem. Tudo em nome de uma democracia falsa. Esse é o paradoxo do discurso dominante da mídia, e também seu álibi; faz parecer que luta pelo estado de direito.

Porém Negri diz que todos os governos do ocidente são corruptos, pois corromperam o conceito de democracia. As únicas opções que nos dão contra essa democracia falsa se referem a formas de governo arcaicos. Contra a democracia representativa está o autoritarismo. As outras opções, os movimentos de multidão, não existem.

quarta-feira, 30 de março de 2011

os mil platôs e o anti-édipo

Eu tentei experimentar alguns conceitos do Mil Platôs de Deleuze e Guattari na monografia quando estava na graduação. Tentei apenas, não sabia o que fazer com eles. Não entendia nada, mas não conseguia não ler. Parecia uma coisa meio masoquista. Na época eu queria ser escritor de literatura, e pelo menos nela algumas coisas se cristalizavam, mas por via dos afetos.

No mestrado comecei a sentir necessidade de fazer estudos de Deleuze e Guattari pela relação estreita entre eles e Negri e Hardt. Daí fui mais cauteloso, peguei vários livros e foquei em um conceito, o de devir. Fiz uma pesquisa rizomática de Mil Platôs, Cartografias do Desejo, Diálogos, entre outros. Também outros autores que fizeram sua leitura do conceito me ajudaram muito, como Giuseppe Cocco e Lazzarato. No fim consegui fazer uma boa fotografia da noção, e experimentei a criação de conceito de devir, o que chamo de devir-pobre do jornalismo. Mas o trabalho foi duro.

Acho que é duro ler os mil platôs, pois é pouco recuperado. Deleuze dizia que ele era como um filho bastardo e que por isso mesmo gostava tanto dele. Essa não recuperação faz com que o livro pareça absurdo à primeira vista, assustador, e por isso aberto a um campo de possíveis; que merece ser atualizado.

Tô pensando nisso, pois estou dando uma olhada no Anti-Édipo. O livro não vai me ajudar muito por focar na psicanálise, na desconstrução de Freud e Lacan. Me parece que tem uma diferença grande entre ele e os mil platôs.

Lia um texto de um pesquisador do campo da psicanálise que dizia: não dá para ler o Anti-Édipo e não dá para não o ler. Por isso uso um método, leitura rápida, me prendendo em uma passagem aqui outra lá, sem compromisso, leitura de superfície; e não achei ainda um eixo conceitual - que possa usar como ferramenta na pesquisa, que me interesse - para focar.

Recortei uma passagem do livro e colei abaixo. Trata do desejo de repressão, do desejo que produz real. Essa passagem é parecida com a fórmula de La Boétie e remete à inversão de Foucault: submissão voluntária ou insubmissão voluntária. E tem uma relação direta com o trabalho de Negri e Hardt (estes spinozianos): a soberania é uma relação, entre dominantes e dominados. Sobre fascismo e desejo é dito muita coisa nos mil platôs: o fascismo molecular de bando, as linhas de fuga mortíferas. Ser fascista molecular e libertário molar, o que é retomado em Cartografias do Desejo. Molecular e molar são os componentes da cartografia dos autores, os devires (moleculares) atravessam os segmentos molares.


Do Anti-Édipo, lá na página 33 (a leitura do primeiro capítulo valeu a pena só por essa passagem)

É por isso que o problema fundamental da filosofia política é ainda aquele que Spinoza soube formular (e que Reich redescobriu): «Porque é que os homens combatem pela sua servidão como se se tratasse da sua salvação?» Como é possível que se chegue a gritar: mais impostos! menos pão! Como diz Reich, o que surpreende não é que uns roubem e outros façam greve, mas que os explorados e os esfomeados não estejam permanentemente em greve; porque é que há homens que suportam há tanto tempo a exploração, a humilhação, a escravatura, e que chegam ao ponto de as querer não só para os outros, mas também para si próprios? Nunca Reich mostrou ser um tão grande pensador como quando se recusa a invocar o desconhecimento ou a ilusão das massas ao explicar o fascismo, e exige uma explicação pelo desejo, em termos de desejo: não, as massas não foram enganadas, elas desejaram o fascismo num certo momento, em determinadas circunstâncias, e é isto que é necessário explicar, essa perversão do desejo gregário.

terça-feira, 29 de março de 2011

big brother brasil 11

Hoje é o grande dia, quem vence: a putinha encantadora, o patinho encantado ou a rainha engraçada?

os movimentos recentes da multidão na mídia

No primeiro semestre do mestrado produzi um artigo para uma disciplina relacionada ao jornalismo. Pesquisei arquivos da Folha de SP que tratavam dos manifestos em 1999 contra a reunião da OMC em Seattle; aquele acontecimento inaugural das lutas em rede, segundo Negri e Hardt e Lazzarato. Cheguei a uma conclusão pouco original: as mídias simplesmente não entenderam o que aconteceu na batalha de Seattle.


No entanto essa consideração permaneceu em minha pesquisa, hoje tenho mais argumentos para afirmar que a mídia por ser legitimadora do poder, simplesmente nega os movimentos da multidão. Poderia ser dito que com a revolução dos povos árabes e sua exposição massiva que a afirmação é errônea. Acho que não.

O que nós sabemos das lutas árabes redunda no senso comum, o que a mídia nos dá: o povo unido contra a figura carismática do poder. Um contra um, em conflito simétrico. A multidão não é una, mas sim o povo legitimado pela tradição. Um povo tem uma identidade, é fácil de o compreender. A multidão é monstruosa, compreendê-la exige um método, ou uma longa preparação.

Nada sabemos sobre a complexidade de grupos, demandas, lutas que são sobrecodificadas pela mídia na imagem (fotográfica) do povo. E agora a coisa fica ainda mais previsível: a luta do ocidente contra o oriente, a luta dos Estados dominantes contra o Estado autoritário. Mesmo quando o discurso se torna menos sacana, a história parece a mesma de sempre: a tomada de poder do Imperialismo estadunidense.

A mídia é conservadora, todo mundo sabe disso; mas temos que pensar o que significa esse “ser conservador”: ela não é muito inteligente, não entende as coisas? Ou como disse acima, tenta conservar o poder escondendo o jogo, deixando de lado a criatividade da multidão?

No dia 26 de março aconteceram os manifestos em Londres, com 500 mil pessoas. Coisa do tipo só nas manifestações de 2003 contra a guerra do Iraque. A mídia brasileira não tem falado sobre isso. Talvez por estar perto demais.

Talvez o conflito árabe tenha dado impulso para as manifestações. Todo acontecimento abre campos de possíveis, que são atualizados. As revoltas árabes nos dão de presente a prova que o desejo deseja mais que sua repressão, deseja sua potência, uma nova realidade. Mesmo a mídia não pode esconder que o poder mais endurecido pode ser derrubado. Como disse Lazzarato: nós não aceitamos as coisas como aceitávamos antes.

M-26 - marcha dos 500 mil em Londres

Tradução do Indymedia Londrino


300-500000 pessoas marcharam pelo centro de Londres em 26 de março. Os manifestantes protestaram contra as medidas governamentais de austeridade que forçam a maior parte da população, e especialmente os trabalhadores do setor público a pagarem pela crise econômica que eclodiu do setor bancário há dois anos.


A maioria dos manifestantes [...] participaram na manifestação TUC que fez o seu caminho de Embankment ao Hyde Park. Além disso, muitos grupos mostraram a sua vontade de fazer mais do que em março, com ações de protesto sendo organizadas por vários grupos.


Ativistas de ação direta se direcionaram a London's West End, o distrito de compras da classe alta. Eles quebraram janelas e atiraram com armas de paintbomb em edifícios, como gesto simbólico. Outros fizeram açôes não-violentas em alvos empresariais identificados como sonegadores de impostos ou de alguma forma responsáveis ​​pela crise econômica.


Fortnum and Mason foram ocupados por manifestantes em uma ação UKuncut que se seguiu à ocupação de várias lojas e bancos em Oxford Street. 149 pessoas foram detidas na sequência da ocupação.

vídeos da demo